Qual é o valor que você dá para a liberdade?
Qual é o valor que você dá para a liberdade?
Você se considera livre? O que faz com que você pense que tem liberdade?
A grande questão sobre a nossa visão da liberdade pode ser feita em comparação com o outro. Simples assim, você se acha livre por que o vizinho parece ter um quintal muito menor que o seu, não é mesmo?
Basta ver como a política de alguns países é feita e você chegará a conclusão de que sim, isto o que nós estamos vivendo se chama liberdade. Aqui, somos livres!
Será que somos, essa é a grande questão. Você é realmente livre?
Você e a sua liberdade inalienável de rodar na rodinha do hamster
Existe a liberdade, e talvez isso esteja fora da discussão, mas qual é o gosto dela? Ou a cor, ou o cheiro?
Vejamos um exemplo concreto: se você quiser exercer a sua liberdade pode agora mesmo criar um site e utiliza-lo para escrever o que desejar sobre quem for. Até mesmo postar vídeos ou áudio expressando as suas ideias, elas ficarão disponíveis para que o mundo as conheça. Isso só pode ser liberdade, não é mesmo?
A liberdade de quem escolhe entre duas coisas
Muito bem, o seu site libertador – libertador – será feito em uma lista de até 10 plataformas, mas tenho certeza de que a escolha final será bem reduzida. Ainda estou seguro de que eu acertaria a plataforma escolhida, mesmo sem conhecer você ou seu site.
Após o site pronto, se você quiser que ele seja visto terá que buscar canais de divulgação, desejando que ele seja mostrado ao público. Se quiser que o site entre nas buscas terá que jogar o jogo de apenas uma empresa: o Google. Simples assim, o seu conteúdo deverá ser feito conforme o Google preferir, para que o Google coloque nas primeiras páginas.
Se resolver que as redes sociais são mais indicadas para promover o seu conteúdo, então as suas opções sobem para o número esmagador de 5: Facebook, Instagram, Twitter, Youtube e – vá lá – uma outra da sua preferência.
Sua incrível liberdade resolvida por meia dúzia de empresas
Eu sou de 87, então, quando tinha perto de 13 anos e sentei pela primeira vez de frente para um computador prometeram-me que ele seria o responsável pelo acesso ao conhecimento global, todo o conhecimento do mundo estaria lá.
Pode até estar, mas se não estiver dentro das regras de rankeamento do Google, tudo o que sobra mesmo é o senso comum.
Alguém pode dizer “ah mas…. você pode utilizar outros sites de busca, pode utilizar outros navegadores, você…” Pode, mas se quiser que meu o realmente encontre um grande público, o jogo é esse e nós dois sabemos.
Tudo é assim, tudo é assado
Essa realidade está presente em como funcionamos atualmente, no cerne das nossas escolhas. Você verá que a sua grande e inacreditável seleção de escolhas não passa de uma ilusão.
Diversas opções de telefonia, todas com o mesmo serviço, todas com o mesmo preço, todas com as mesmas reclamações. Até o atendimento é o mesmo.
Ao tentar comprar roupas estará no mesmo esquema, eletrodomésticos, peças para o seu notebook, câmeras para o seu trabalho, lentes… escolha um produto, a incrível opção de compras estará reduzida. Muito mais do que você imagina.
Se quebrarmos em peças, você descobrirá que nem mesmo o seu celular chinês super lado B descoladíssimo que é difícil de encontrar, encomendado direto da China. Esse celular foi fabricado com as peças de 3 empresas, duas delas presentes no mercado nacional. Ele é só uma carcaça nova, com um nome legal e um punhado enorme de mais do mesmo dentro.
Isso se ficarmos só no consumismo, fingindo que todo o resto é brincadeira
Aqui estou falando só das vontades que você pode ter como consumidor ou criador de conteúdo. Sua liberdade de escolher entre dois shampoos diferentes, mas que o dinheiro irá parar no mesmo conglomerado.
Não quero nem tocar no assunto de: alguém – não você – decide se o seu tomate terá ou não agrotóxico. Alguém – não você decide qual é a % ideal de fumaça no ar que você respira. Alguém – não você – decide qual a proporção fezes de rato/alimento que pode estar presente no fast-food do shopping.
Decisões enormes que influenciam diretamente a sua vida são tomadas por pessoas que não são você. Aí o que você faz? Se adapta. Aprende as barracas em que as verduras não contém agrotóxicos, descobre modos de fazer mais dinheiro ao longo da vida para não depender da aposentadoria, não pega mais o ônibus, não come mais no shopping, usa uma máscara para ajudar na respiração…
Mas você sabe que a sua liberdade está tolhida, não sabe? Você sente isso. Eu sei.
Então o que eles fazem?
A pior coisa que pode cair no colo de quem manda é ele ter um grupo de súditos descontentes com certas decisões. Para ele isso é péssimo, seja ele uma grande empresa instalada no Vale do Silício ou um político.
Saída fácil para resolver o problema?
Faça o descontente acreditar que o risco é o vizinho – ei, você, eu sei que você sente que tem pouco, eu sei que você sente que está perdendo, mas tá vendo aquele vizinho ali. Ele tem menos ainda, e posso contar uma coisa? Ele não liga para você e para o seu modo de fazer as coisas, ele quer vir aqui, pegar tudo o que é seu (que é pouco e custou tanto suor) e levar para ele. De graça, ainda de quebra se ele puder ele vai transar com as mulheres que vivem com você.
E o que você faz?
Você se fecha, se protege, fica com medo. Fica com muito medo, entra em estado de choque. Para quem vê de longe, parece muito um cachorro acuado. Nota-se o desespero, os dentes para fora, a raiva, a angústia.
Se nós ao menos pudéssemos ver…
Tática repassada, reprisada, com leves variações, mas já até desgastada. E infalível.
Faça-os brigar, enquanto nós curtimos uma liberdade genuína.
Mas e o Cinema, Cinerama?
Os filmes que falam sobre a liberdade, qual é o custo dela?
As produções artísticas são reflexos das preocupações e angústias da nossa época. Gosto de pensar que os melhores filmes, os livros marcantes, as músicas que comovem, ou os quadros que deixam impressões foram produzidos em decorrência do que tocava mais fundo nos nossos dias.
Produções assim, que dialogam com o que existe de mais profundo na história de cada época, são imortais.
São quadros eternizados, sinfonias que para sempre tocarão a canção da vitória, compostas com o auxílio de canhões para aumentar a imersão dos apreciadores. Livros que foram banidos por um certo tempo, apenas para ressurgirem depois como verdadeiros manuais sobre a alma humana.
E claro, muitos filmes. Filmes serão eternizados e ganharão destaque, disso não tenho dúvida. Esses filmes falarão sobre o que? Falarão de liberdade?
Talvez o cinema já tenha produzido alguns imortais. Talvez não. Infelizmente nós não estamos apreciando nenhum deles.
Estamos ocupados demais defendendo com unhas e dentes o pouco que nós temos. Virando nossa raiva para outras pessoas que têm quase tão pouco quanto nós. Acuados, como cachorros raivosos.