Don’t Fuck With Cats é um documentário criminal da Netflix lançado no ano passado e que está entre os melhores do gênero disponíveis no serviço de Streaming. São três episódios de aproximadamente 60 minutos em média que mostram diversos pontos de vista de um mesmo crime.
Ao contrário de outras produções do gênero, muito comuns em canais por assinatura, o documentário segue o padrão de produções da Netflix e tenta não cair em sensacionalismo barato, ou apelação emocional – tenta, mas nem sempre consegue, falaremos mais disso.
Desenvolvido para ser muito mais do que um relato sobre alguns crimes, Don’t Fuck With Cats faz o público passear pela narrativa, brincando com a expectativa das pessoas e até gerando diversas dúvidas.
Vamos ver quais são os acertos.
Uma nota antes de começar a crítica: como esse documentário fala de crimes reais eu vou tentar ao máximo não dar spoilers, o que pode tornar alguns trechos “etéreos” demais. De todo modo, prometo fazer o máximo para que você absorva bem a crítica.
Os méritos de Don’t Fuck With Cats
A premissa básica consiste em: uma pessoa postou vídeos na internet mostrando gatos sendo torturados e mortos, diversas pessoas se revoltaram contra os vídeos e iniciaram uma caçada na tentativa de descobrir quem foi o responsável pelas mortes e vingar os gatos.
O primeiro episódio serve para assentar essa perspectiva de que: existe uma pessoa sem escrúpulos usando a internet para espalhar conteúdo terrível e há um grupo de pessoas absurdamente dedicadas na captura desse indivíduo.
Esse primeiro episódio fala muito pouco da participação policial (ou se sequer existe uma) e também não contextualiza a vida das pessoas que estavam investigando o responsável pelo vídeo. Não é uma história sobre personagens específicos caçando um homem, é uma história sobre usuários da internet caçando um psicopata (e o documentário até utiliza bastante os “nicknames” dos usuários).
Apesar de que a história depois será centrada em dois “caçadores” oficiais e a vida dessas pessoas é mostrada por alto, não se trata de um embate entre personalidades. São duas “encarnações” da sociedade “comum” buscando vingança contra uma pessoa degenerada que intoxica a internet.
Percebe a diferença? Ao não humanizar tanto os “caçadores” o documentário coloca o público como central. Fica-se a impressão de que qualquer um seria capaz de ter o ímpeto que eles tiveram, se as notas certas de revolta fossem tocadas no espírito de quem assiste aos vídeos de tortura.
Mas o principal acerto desse primeiro episódio, para mim, está na construção na narrativa que se desdobrará nos seguintes. É uma história sobre as causas que fizeram o homem publicar um vídeo assassinando gatos, não apenas sobre a psicopatia pura e simples
O documentário não defende uma maldade inerente, ele explora motivações
Eu gosto disso, gosto da forma como a história foi construída ao redor de uma pessoa que, se atingida por certo nível de egoísmo, vem a tornar-se um degenerado assassino de gastos. A trama se desenrola e novos personagens vão surgindo na proporção em que mais vídeos são postados e as ações tanto do perseguido, quanto dos perseguidores, vão tomando novas dimensões.
Onde Don’t Fuck With Cats falha
A forma como a história foi roteirizada conta uma trama perfeita sobre egoísmo, idolatria, desejo por fama, repulsa por certas características e comoção coletiva em busca de um mesmo objetivo. Estava tudo ali, mas o documentário também tentou encapsular todas essas questões em uma crítica ao uso da tecnologia.
Assim como Black Mirror e também como um (muito menos famoso) Wrinkles the Clown – entre tantos outros – virou lugar comum questionar qual é o papel da tecnologia e principalmente das redes sociais no nosso comportamento e sobre como nossos hábitos de consumo são transferidos para essas redes.
É a visão de que nós passamos o dia agindo online como se a internet fosse um grande mercado e nós estivéssemos escolhendo produtos nas prateleiras. Essa é, ao menos, a crítica que pode ser conseguida em Don’t Fuck With Cats.
Mas o documentário não é sutil o bastante em suas observações e algumas frases foram usadas de propósito para “causarem choque.”
Acontece que quando uma ideia do tipo surge e o público percebe que aquela cena específica deveria causar arrepios, mas não causa, o que funciona com um efeito contrário. Tirando força do filme.
É como ver o zíper na fantasia do mostro do parque. Você até se esforça para sentir medo dele, mas não consegue mais voltar para dentro da história. A narrativa perde você.
Entende o que eu quero dizer? A crítica está lá e ela seria interessantíssima, se os produtores e responsáveis conseguissem incrementar no todo. Do jeito que eles fizeram, com frases feitas dignas de fotografias de Instagram, não dá para absorver muito bem e em alguns momentos essas críticas são até enjoativas.
“Ok, eu já entendi, precisamos ter consciência sobre o que nós estamos assistindo e quem nós estamos deixando famosos na internet. Dá para ir além disso? “
De todo modo, Don’t Fuck With Cats vale o investimento de 3 horas. Serão três episódios que passarão rapidinho e se você não pesquisar sobre os crimes nem sobre o responsável por eles terá uma experiência interessantíssima e até algumas surpresas.
Nota 3 de 5, não é maravilhoso, mas acho que, dentro do gênero, ele encontra um lugar de destaque.
(ps: essa nota ignora os últimos 30 segundos do último episódio, se considerar essa cena a nota poderia ir facilmente para 2, ou até para 1. Se você ver você vai entender)
Avisos finais
Esse redator também é escritor. Se estiver com vontade de pegar uma leitura leve, rápida, com cenas marcantes e muitos assassinatos, conheça dois dos meus livros. Um Link está aqui, o outro aqui. Você também pode me seguir no Instagram. Até mais!!
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